Cristo Pantocrator

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Sobre os oito vícios

Sobre os oito vícios: sobre o controle do estômago
São João Cassiano

(The Philokalia, The Complete Text, Volume One, Faber and Faber, New York, 1979, pags. 73 e 74)
Traduzido da verão inglesa de G. E. H Palmer, Philip Sherrard e Kallisto Ware, por Rochelle Cysne.

"Sobre os oito vícios: escrito para o Bispo Kastor"

Tendo composto o tratado sobre as instituições cenobíticas, eu estou neste momento mais uma vez encorajado por vossas orações a tentar escrever alguma coisa sobre os oito vícios: glutonaria, luxúria, avareza, ira, inveja, apatia (preguiça), auto-estima e orgulho.


"Sobre o controle do estômago"

Eu falarei primeiro sobre o controle do estômago, o oposto à glutonaria, e sobre como jejuar e o quê e como comer. Eu não direi nada de minha própria conta, e sim apenas o que eu recebi dos Santos Padres. Eles não nos deram apenas uma regra singular do jejum, ou uma medida e padrão para a comida, já que nem todos possuem a mesma compleição; idade, doença ou fraqueza do corpo criam disparidades. Mas eles nos deram uma simples meta: evitar comer demais e encher nossas barrigas. Eles também descobriram que jejuar por um dia é mais benéfico e de maior ajuda para se alcançar a pureza do que estender o jejum por um período de três, quatro ou mesmo sete dias. Aquele que jejua por muito tempo, eles afirmam, acaba por comer depois demais. O resultado é que muitas vezes o corpo se torna enervado pela falta indevida de comida e lento ao longo de seus exercícios espirituais, enquanto que outras vezes, oprimido pelo excesso de comida ingerida, deixa a alma preguiçosa e negligente.

Eles também descobriram que se alimentar apenas de verduras não é para todos e que nem todo mundo pode viver à base de pão seco. Eles dizem que há aqueles que podem comer duas medidas de pão seco e ainda permanecerem famintos e que há aqueles que podem comer um quarto disso e se satisfazerem. Como eu disse, os Padres proferiram uma regra básica de auto controle: "não sejam enganados pelo desejo de uma barriga cheia" (Provérbios 24: 15. LXX) ou sejam desviados pelo prazer do paladar. Não é a variedade de alimentos que acendem os dardos inflamados da luxúria, mas apenas a sua quantidade. Qualquer tipo de alimento em demasia no ventre engendra a semente do desregramento. Não é apenas muito vinho que embota a nossa mente: também muita água ou muito de qualquer coisa torna-a sonolenta e estupidificada. Os sodomitas foram destruídos não por causa do muito vinho ou tanto por outras comidas, mas por causa do excesso de pão, como os Profetas nos contam (cf. Ezequiel 16:49).

Doença física não é um obstáculo para a pureza do coração, se garantimos dar ao corpo o que a doença requer e não o que agrada nosso desejo de prazer. O comer é para garantir a nossa vida e não para nos escravizar aos impulsos do desejo. Comer moderadamente e racionalmente tem como meta manter a saúde do corpo e não para nos privar da santidade.

Uma regra básica de auto-controle proferida pelos Padres é esta: pare de comer enquanto ainda está faminto e não continue até se satisfazer. Quando o Apóstolo fala: "Não faça provisão para satisfazer os desejos da carne" (Rom, 13: 14) ele não está nos proibindo de garantir o que é necessário à vida; ele está nos advertindo contra a auto-indulgência. Ademais, abster-se de comida não contribui para a perfeita pureza a menos que outras virtudes sejam atualizadas também. Humildade, por exemplo, praticada através da obediência e através do esforço corporal é de grande ajuda. Se nós rejeitamos a avareza por termos pouco ou nenhum dinheiro, mas também pelo desejo de não ter dinheiro nenhum, isso nos conduz em direção à pureza de alma. Ser livre da raiva, da inveja, da auto-estima e do orgulho contribuem para a pureza da alma em geral, enquanto que auto-controle e jejum são especialmente importantes para gerar a específica pureza de alma que vem por meio do auto controle e da moderação. Ninguém que esteja com o estômago cheio pode lutar contra o demônio da luxúria. Assim, nossa luta inicial deve ser ganhar controle sobre nosso estômago e sujeitar nosso corpo  não apenas ao jejum mas também à vigília, aos trabalhos manuais e à leitura espiritual, e por meio disso tudo concentrar nosso coração no temor da Geena e na saudade do Reino dos Céus.


Ícone de São João Cassiano de Roma.

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