Cristo Pantocrator

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Que não devemos nos desesperar, mesmo pecando muitas vezes

Também de São Pedro de Damasco
Páginas 160 e 161.
Continuação do post anterior

Que não devemos nos desesperar, mesmo se pecarmos muitas vezes




Mesmo que você não consiga ser quem gostaria ou deveria, você não deve se desesperar. Já é suficientemente mau que tenha pecado; por que piorar sua situação tratando Deus como se ele fosse impotente? Ele, que por amor a você criou o grande universo que você vê, é incapaz de salvar a sua alma? E se você diz que este fato somado à Encarnação tornam sua condenação ainda mais grave, então arrependa-se; Ele receberá seu arrependimento, como Ele aceitou aquele do filho pródigo (cf. Lucas 15:20) e da prostituta (cf. Lucas 7:37-50). Mas se o arrependimento é demais para você, e você peca por hábito, mesmo quando não quer, mostre humildade como o publicano (Lucas 18:13); isto basta para garantir sua salvação. Pois aquele que peca sem conseguir arrepender-se, mesmo que não se desespere, deve por necessidade reconhecer-se a si mesmo como a mais vil das criaturas, e não ousar julgar e censurar quem quer que seja. De preferência, ele vai se admirar da compaixão de Deus, e será pleno de gratidão para com seu Benfeitor, e assim possa receber muitas bençãos também. Ainda que sujeito ao demônio por seus pecados, pelo temor a Deus ele desobedece o inimigo que mais tarde procura lançá-lo no desespero. Por conta disso ele garante sua porção com Deus; pois ele é grato, ele dá graças, ele é paciente, teme a Deus, e não julga para não ser julgado. Todas estas qualidades são cruciais. É como São João Crisóstomo fala sobre a Geena: ela é quase tão benéfica a nós quanto o Reino dos Céus, já que muitos entram no Reino por temor dela, e poucos entram por amor ao Reino mesmo; se todos entramos, é em virtude apenas da compaixão de Deus. A Geena persegue-nos pelo medo, e Reino nos abarca pelo amor, e através deles ambos somos salvos pela graça de Cristo.
Se aquele muito atacado por muitas paixões de alma e corpo permanecer pacientemente, não deixando que a negligência surpreenda sua livre vontade e o leve ao desespero, então será salvo. Similarmente, aquele que obteve o estado de desapego, liberdade do medo e luz do coração, rapidamente cai se não confessa a Deus continuamente e não julga ninguém. De fato, se ele se atreve a julgar alguém, ele torna evidente que ao adquirir sua fortuna, ele se baseou apenas em suas próprias forças, como afirma São Máximo. São João de Damaskos diz que se alguém ainda está sujeito às paixões, e ainda está privado da luz do conhecimento espiritual e não é orientado por ninguém, ele se encontra em grande perigo, e na mesma situação está a  pessoa recebeu o desapego e o conhecimento espiritual de Deus e não ajuda outras pessoas.
Não há nada mais benéfico aos fracos do que retirar-se em silêncio, ou ao homem sujeito às paixões e sem conhecimento espiritual do que a obediência combinada com o silêncio. Nem há qualquer coisa de superior do que conhecer-se sua própria fraqueza e ignorância, nem qualquer coisa mais prejudicial do que não as reconhecê-las. Nenhuma paixão é tão detestável quanto o orgulho, nem tão ridícula quanto a avareza, "a raiz de todos os males" (1 Tim 6:10); pois aquele que encontrou uma mina de prata e resolve escondê-la novamente debaixo da terra, permanece sem qualquer progresso. Por esta razão o Senhor diz: "Não ajunteis tesouros na terra" (Mateus 6:19); e novamente; "Onde está o teu tesouro, ai estará também o teu coração" (Mateus 6:21). Pois o intelecto de um homem é atraído pelo desejo das coisas com as quais se ocupa, sejam estas coisas terrenas, ou passionais, ou celestiais ou bençãos eternas. Como São Basílio, o Grande diz, um hábito persistente adquire toda a força da natureza.
Uma pessoa fraca deve especialmente prestar atenção às inspirações de sua consciência, para que ela possa libertar a sua alma de toda condenação. Caso contrário ao final de sua vida ela pode se arrepender em vão e lamentar-se eternamente. A pessoa que não pode suportar por amor a Cristo a morte física, como fez Cristo, deveria pelo menos estar disposta a suportar a morte espiritual. Deste modo, ela será um mártir com respeito à sua própria consciência, e não permitirá que demônios a sujeitem e assaltem, nem aceitará suas sugestões, mas as vencerá, como os santos mártires e os santos padres. Os primeiros eram mártires corporalmente, os últimos mártires espirituais. Quem se esforça ligeiramente, destrói o inimigo; quem cai na negligência é preenchido com escuridão e é destruído.