Cristo Pantocrator

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

As virtudes corporais como ferramentas para a aquisição das virtudes da alma

Continuação do post anterior.
Páginas 103 e 104.

As virtudes corporais como ferramentas para a aquisição das virtudes da alma

É bom ser lembrado de certas coisas frequentemente, e eu começarei por citar a maior parte dos escritos de outros autores. Pois o que estou a dizer não é invenção minha, mas vem de palavras e discernimento das Divinas Escrituras e dos santos padres.

São João Damascos afirma que as virtudes corporais - ou, de preferência, as ferramentas da virtude - são essenciais, pois sem elas as virtudes da alma não podem ser adquiridas. Mas deve-se buscá-las em humildade e com conhecimento espiritual. Se nós não a perseguimos deste modo, mas apenas por eles mesmos, então eles não servem a nenhum propósito, como são inúteis as plantas que não produzem qualquer fruto. Ademais, ninguém pode totalmente ser mestre em qualquer arte sem longa aplicação e sem a mutilação de seus próprios desejos. Por isso, depois da prática ascética, nós necessitamos de conhecimento espiritual, devoção total a Deus em todas as coisas, e estudo cuidadoso das sagradas Escrituras; pois sem estas coisas ninguém pode adquirir virtude. As pessoas capacitadas pela Graça a se dedicarem totalmente a Deus, sempre obtêm o Soberano Bem; aquele que não alcançou este ponto deve se precaver para não se tornar negligente em qualquer coisa. Bem aventurados são aqueles que são completamente devotados a Deus, ou pela obediência a alguém vivida na prática das virtudes e vivendo uma vida ordenada no silêncio, ou ainda vivendo por conta própria no silêncio e total desapego, escrupulosamente obediente à vontade de Deus, e procurando o conselho dos mais experientes em tudo o que eles dizem ou pensam. Bem aventurados acima de tudo são aqueles que procuram obter desapego e conhecimento espiritual pela sua total devoção a Deus: como o próprio Deus disse pelo Seu profeta, "Aquietai-vos e sabei que Eu sou Deus" (Salmo 46:10). 

Aqueles que vivem no mundo - ou melhor, os que vivem ao modo do mundo, pois isso inclui muitos que se auto-denominam monges - devem tentar atingir uma medida de devoção, como os homens justos de antigamente, que examinam suas pobres almas antes da morte de modo a alterá-las ou humilhá-las, para não lhes advir a total destruição pelos pecados conscientes ou inconscientes. David, de fato, foi um Rei; mas toda noite ele molhava sua cama com lágrimas por causa de sua percepção da divina presença (Salmo 6:6). E Jó disse: "O cabelo da minha carne se arrepiou" (Jó 4:15). Vamos então dedicar, como aqueles que vivem no mundo, pelo menos uma pequena parte do dia e da noite a Deus; e levemos em consideração o que diremos em nossa defesa ao justo juiz no terrível dia do Julgamento. Vamos levar em conta isso, pela sua importância, tendo em vista a ameaça de punição milenar; e não nos preocupemos sobre como devemos viver se somos pobres ou como podemos ficar ricos para dar esmolas, devotando assim toda nossa atenção a questões mundanas. Temos de trabalhar, como diz São João Crisóstomo; mas necessitamos não nos interessar ou nos preocupar com muitas coisas, como disse Nosso Senhor a Marta (cf. Lucas 10:41). Pois o interesse na própria vida nos impede o interesse na salvação da própria alma e no seu estado, já que este é o fim do homem que se dedica a Deus e é atento a si mesmo. É dito na Lei , "Guarda-te " (Deuteronômio 15:9). São Basílio, o Grande, escreveu sobre este texto com maravilhosa sabedoria.