Cristo Pantocrator

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Sobre a edificação da alma através das virtudes

De São Pedro de Damasco
Continuação do post anterior

Sobre a edificação da alma através das virtudes

De acordo com São Basílio o Grande, a principal coisa que necessitamos é perseverança, assim como a terra precisa de água. Nesta terra deve-se estabelecer o fundamento da fé. (cf. 2 Pedro 1:5). Então o discernimento, como um construtor experiente, pode estabelecer lentamente a edificação da casa da alma sob a terra da humildade, edificando pedra a pedra - isto é virtude por virtude - até o telhado, que é o amor perfeito. Então, quando estabelecer bons porteiros sempre portando armas - que são os pensamentos luminosos e as ações divinas capazes de proteger o Rei de ser perturbado - o mestre da casa chega e toma residência lá. Não deve ter porteiro feminino aquele que está ocupado com sua própria obra, como diz São Nilo em sua interpretação do Antigo Testamento: ele explica que foi por esta razão que o patriarca Abraão não designou uma porteira, mas preferencialmente alguém que fosse viril - rápido e de pensamentos incisivos - armado com, entre outras coisas, 'a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus' (Efésios 6:17) para que pudesse combater e matar aqueles que tentassem entrar. Pois tal porteiro é vigilante e está em seu posto para destruir os pensamentos com ação retaliadora e as conversas rejeitando-as. Ele repele tudo o que entra no coração que é contrário aos propósitos de Deus, desdenhando-os e rejeitando-os para que o intelecto iluminado não possa nunca parar de contemplar a Deus e para que não seja esvaziado dos pensamentos divinos. Este é o trabalho da quietude, como assinala São Nilo. Em outro lugar, referindo-se à Sagrada Escritura, São Nilo explica que a distração é a causa do obscurecimento do intelecto. E isto é de se esperar, pois se o intelecto não está completamente contido como água em um tubo, então a mente não pode ser recolhida em si mesma para subir a Deus. E se ela não sobe espiritualmente e saboreia ao menos alguma coisa que está em cima, como ela pode literalmente ser separada do que está abaixo?
Assim, como diz São Paulo (cf. 2 Cor. 5:7), devemos avançar com base na fé, esforçando-nos em nos conformar com a vontade de Deus. E, com o tempo, àqueles que fizerem bons progressos sucederá obter parcial conhecimento derrubando o inimigo. Eles então receberão a plenitude deste conhecimento no mundo que virá, quando o espelho, a vida mortal, for quebrado (cf. 1Coríntios 13:12), e quando a alma não mais desejar contra a carne, ou a carne contra o espírito (cf. Gálatas 5:17), e quando a preguiça não mais engendrar esquecimento ou o esquecimento a ignorância. Isto é o que a maioria de nós experimenta na vida presente, e é por isso que precisamos de um texto escrito para nos lembrar disto. Na verdade, amiúde um pensamento ocorreu-me espontaneamente, e foi ao escrevê-lo que eu o fixei na memória. Assim, em tempo de batalha espiritual, isso me serviu de ajuda ou alívio ou gratidão, apoiado como estava no testemunho da Divina Escritura. Se eu tivesse sido negligente sobre o fato de escrevê-lo, eu não o teria encontrado em caso de necessidade, e teria sido privado de sua ajuda pelo maior de todos os demônios, o esquecimento.
Por esta razão, devemos aprender as virtudes por meio de sua prática, não simplesmente através de conversa acerca delas, para que ao adquirir o hábito delas não venhamos a nos esquecer seus benefícios sobre nós. "O Reino de Deus", como diz São Paulo, "reside não em palavras, mas em Poder" (1 Coríntios 4:20). Pois aquele que tenta descobrir coisas através da prática atual virá a entender o que ganha e o que perde em qualquer atividade que exerça, como diz São Isaac; e ele poderá também dar conselho aos outros, pois ele frequentemente passou provações e consequentemente ganhou experiência. Pois São Isaac nos conta que algumas coisas parecem boas mas escondem não poucos prejuízos, enquanto outras parecem más mas contêm nelas mesmas grande proveito. Por esta razão, ele afirma, nem todo homem pode merecer confiança quando dá conselhos àqueles que o procuram. Só podemos confiar naquele que recebeu de Deus a graça do discernimento e aquele, como diz São Máximo, que adquiriu através de grande humildade e longa prática de virtudes um intelecto abençoado com perspicácia espiritual. Tal homem está em condições de aconselhar, não todo mundo, mas pelo menos àqueles que o procuram voluntariamente e que lhe pedem ajuda por suas próprias escolhas; pois ele aprendeu as coisas em suas verdadeiras ordens. É por causa de sua humildade, e porque seus interlocutores o procuram voluntariamente, que o que ele diz é selado na alma de seus ouvintes: eles estão cheios do calor da fé, reconhecendo este bom conselheiro como se o mesmo fosse o 'maravilhoso conselheiro' de quem fala o profeta Isaías chamando-o "Deus Forte, Legislador, Príncipe da Paz". (Isaías 9:6).
               Isto claro se refere ao Nosso Senhor Jesus Cristo, que disse aos homens que se dirigiram a Ele, "Quem estabeleceu-me juiz ou árbitro sobre vocês?" (Lucas 12: 14). No entanto, Ele também disse, "O Pai empenhou todo o julgamento do Filho" (João 5:22). Através de Sua sagrada humildade, Ele nos mostra aqui, como em todo lugar, o caminho da salvação e como Ele não restringe ninguém. "Se alguém quiser vir após Mim", Ele diz, "renegue-se a si mesmo, tome a sua cruz e Me siga" (Mateus 16:24), isto é, não se preocupe com sua própria vida em qualquer sentido, mas assim como Eu ativamente submeti Minha visível e voluntária morte pela salvação de todos, assim sigam-Me em palavra e ação, como fizeram os apóstolos e mártires; e se alguém não pode fazer isto aparentemente, deixe-o suportar a morte na medida em que a probidade de sua intenção está em causa. Novamente, ao jovem rico Ele disse: "Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres, vem e Me segue" (Mateus 19:21).
              Com referência a este incidente São Basílio (Sermão sobre o Jovem Rico) disse que o jovem rapaz mentiu quando afirmou guardar os mandamentos; pois se os guardasse não teria acumulado tantas posses, já que o primeiro mandamento da Lei é "Amarás o Senhor teu Deus com toda a tua alma" (Deuteronômio 6:5). A palavra "toda" proíbe quem ama a Deus a amar qualquer outra coisa de modo a entristecer-se caso ela lhe fosse retirada. Após isso a Lei diz, "Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (Levítico 19:18), isto é, amarás a todos os homens. Mas como ele poderia ter guardado os mandamentos tendo tantas possessões e estando apaixonadamente unido a elas quando a tantos homens falta o alimento diário? Se, como Abraão, Jó e outros homens justos ele tivesse reconhecido tais possessões como propriedades de Deus, ele não teria partido triste. São João Crisóstomo (Homília sobre Mateus 63,2) diz a mesma coisa: o jovem acreditou que o que era dito a ele pelo Senhor era verdadeiro, e foi por esta razão que ele partiu cheio de tristeza, pois não tinha força para por em prática. Pois há muitos que acreditam nos ditos da Escritura, mas não possuem a força para pô-los em prática.