Cristo Pantocrator

sábado, 5 de outubro de 2013

Breve discurso para a aquisição das virtudes e abstinência das paixões

Também de São Pedro Damasco
Continuação do post anterior
Páginas 162 a 164


Breve discurso para a aquisição das virtudes e abstinência das paixões


De acordo com São Basílio, o grande, nada obscurece tanto a mente quanto o mal, e nada o ilumina tanto quanto a leitura espiritual na solidão. Nem nada preenche tanto a alma com doce lamento do que a lembrança da morte, nem contribui tanto para nosso secreto progresso do que se auto reprovar, extirpando nossa vontade própria. Por outro lado, nada auxilia secretamente tanto a nossa destruição quanto a autossatisfação, ou então nos afastar de Deus, ou nos aproximar de homens resmungões, e assim nos predispor a uma vida desordenada e à loquacidade. Novamente, nada fomenta tão rapidamente a aquisição das virtudes do que a vida solitária e a meditação, ou que acelere a gratidão e o reconhecimento do que refletir nos dons de Deus e em nossa própria perversidade. Nada aumenta mais as bençãos que nos foram dadas do que reconhecê-las, contribuindo para  a nossa salvação, mesmo contra nossa vontade, como provocações e tentações. Não há caminho mais curto para Cristo - isto é para o desapego e a sabedoria do Espírito - do que o caminho real que rejeita tanto o excesso quanto a falta em todas as coisas; nem é qualquer virtude capaz de compreender a vontade divina como a humildade, capaz de abandonar todo pensamento pessoal e todo desejo. Nada contribui tanto para a boa ação como a oração pura, e nada impede tanto a aquisição de virtudes quanto a menor distração mental que seja e as fantasias diárias.

Quanto maior a pureza de alguém, mais percebe seus próprios pecados; e quanto mais se peca, mais ignorante se é, mesmo que se pareça puro. De igual modo, quanto mais conhecimento alguém tem, mais ele se percebe como um ignorante, e quanto mais ignorante é de sua própria ignorância e das deficiências de seu conhecimento espiritual, mais ele pensa que sabe algo. Quanto mais pacientemente suportarmos aflições, mais venceremos o inimigo; e, por fim, quanto mais tentamos fazer algo de bom, mais nos vemos como devedores em cada dia de nossas vidas, como fala São Marcos, o Asceta; pois a habilidade e desejo de fazer o bem vem apenas de Deus. É apenas por causa desta graça que somos capazes de fazer algo bom; quando fazemos isto, o que temos, verdadeiramente, que vangloriar? Se nos vangloriamos, isso revela que imaginamos ter feito algo bom por nossos próprios esforços, condenando injustamente aqueles incapazes de fazer o mesmo. Aquele que exige algo dos outros deve igualmente exigir de si mesmo.

Se os pecadores devem tremer porque iraram a Deus, aqueles que foram protegidos pela graça Dele por causa de sua fraqueza e propensão ao desespero devem tremer ainda mais, já que estão profundamente em débito com Ele. Santo Epifânio diz que a ignorância das Escrituras é um enorme abismo; pior ainda é o mal conscientemente cometido; enquanto grande é o benefício que a alma recebe através da Escritura e da oração. Suportar nosso próximo; não afligi-lo quando ele erra conosco mas ajudá-lo a estar em paz quando está em problemas, como coloca São Doroteu; mostrar compaixão para com ele, repartir seu fardo e orar por ele, cheio de esperança que ele se salve e possa gozar de todas as muitas bençãos de corpo e alma - esta é a verdadeira indulgência que purifica a alma e nos conduz a Deus.

Curar uma pessoa é a maior coisa que se pode fazer e excede a qualquer outra virtude, porque entre todas as virtudes não há nada maior ou mais perfeito do que o amor ao próximo. O sinal deste amor é não apenas guardar para si qualquer coisa de que o outro tenha necessidade, mas também que, como o Senhor ordena, deve-se alegremente suportar a morte por amor (cf. João 15:13), encarando isto como uma dívida que se tem a pagar. E assim deve ser: devemos amar nosso vizinho a ponto de morrermos por ele, não apenas porque a natureza requer isso, mas sobretudo em virtude do precioso sangue derramado por nós por Cristo que nos ordenou a amar neste sentido. Não se ame, diz São Máximo, e amarás a Deus; não agrade seu ego, e amarás seu irmão. Tal amor nasce da esperança; e ter esperança é crer sem hesitação que conseguiremos seguramente o que esperamos. Isto, por sua vez, nasce de uma firme fé, que não tem interesse no que quer que seja, nem na própria vida nem na morte, mas lança todos os cuidados em Deus (Cf. I Pedro 5:7), como eu disse quando falava sobre a pessoa que quer adquirir os sinais do desapego, do qual a fé é o fundamento. Quem tem fé deve refletir que já que Deus em sua extrema bondade criou todas as coisas -incluindo nós- do nada, Ele é certamente capaz de prover como Ele pensa ser ajustável à nossa alma e corpo.