Cristo Pantocrator

sábado, 2 de março de 2013

Obediência e Quietude

Continuação do post anterior.
Páginas 106 a 108

Obediência e Quietude

Se queremos perceber nossas condições letais, nós devemos abandonar nossos próprios desejos e todas as preocupações desta vida. Por meio desse afastamento de tudo, devotemo-nos assiduamente a Deus com devoção que é verdadeiramente abençoada e divina. Que cada um de nós procure sua própria alma através da leitura das Sagradas Escrituras, ou em perfeita obediência de corpo e alma ou na quietude, seguindo o caminho dos anjos. Isso é especialmente importante para aqueles que ainda estão sujeitos às paixões e não podem controlar seus próprios desejos, se grandes ou pequenos.

"Sente-se em sua cela", foi dito, "e sua cela lhe ensinará todas as coisas". Ora, como São Basílio coloca, "A quietude inicia a purificação da alma". É também verdadeiro o que Salomão diz, "Deus deu uma enfadonha distração aos filhos dos homens, para que assim eles possam se distrair com coisas vãs" (Eclesiastes 1:13). Isso é para evitá-los de se arrastarem com sua estúpida e apaixonada inércia para coisas ainda piores.

O que, porém, nós dizemos sobre aqueles que foram resgatados pela Graça de Deus destas armadilhas e se tornaram um monge, vestindo o hábito angélico da vida solitária e monástica, e logo, como diz São Dionísio Aeropagita dizem e mesmo mostram, em palavra e ação, tão longe quanto possível, uma imagem de um único Deus? Não deveria esta pessoa ser sempre devotada a Deus e atenta com seu intelecto a tudo o que empreende, meditando continuamente em Deus de acordo com o estado que ele alcançou? Isso é o que Santo Efrem e outros santos padres recomendaram para aqueles que se estabeleceram no caminho espiritual. Um homem deve ter um salmo nos lábios, outro um verso de um hino; todos aqueles que não se acharam dignos de entrar no reino da contemplação e do conhecimento espiritual, os pais nos falam, devem cuidar do intelecto com salmos e  tropários. Neste sentido, cada um será engajado em algum tipo de meditação, mesmo quando tiver trabalhando, ou viajando, ou deitado indo dormir. Tão logo cessou essa regra de oração, nós devemos enclausurar o intelecto em alguma forma de meditação, para que o inimigo não o encontre desleixado na rememoração de Deus e o ataque com vaidades ou coisas ainda piores. Este conselho é dado a todos.

Por meio das virtudes do corpo e da alma, e após muitos esforços, uma pessoa está capacitada a despertar noeticamente, pela Graça de Cristo, e a engajar-se no esforço espiritual - o esforço do intelecto - assim que ele começa a sofrer interiormente por sua própria alma. Quando isso acontece, ele deve guardar como a pupila dos olhos o pensamento que o induz às lágrimas tão dolorosas, para usar as palavras de São João Clímaco. Ele deve continuar a fazer isso até que Deus em Sua providência, impeça-o de crescer no orgulho, pelo fogo e pela água. O fogo é a dor do coração e sua fé ardente; a água são as lágrimas. E eles não foram dados a todos, como diz Santo Atanásio, o Grande, mas apenas àqueles habilitados pela graça a ver as coisas terríveis que ocorrem antes e após a nossa morte, e que na tranquilidade suporta-as tranquilamente na mente. Como diz Isaías: "O ouvido do hesicasta escuta segredos maravilhosos" (cf. Jo 4:12), e novamente, "Devote-se no silêncio e conhece!" (Salmo 46:10).

A tranquilidade também engendra conhecimento de Deus, pois ela é de grande ajuda mesmo para os mais fracos e para aqueles mais sujeitos às paixões. Capacita-os a viver sem distração e afasta-os da sociedade humana, dos cuidados e encontros que obscurecem o intelecto. Eu não me refiro simplesmente aos cuidados humanos mas também àqueles que parecem insignificantes e sem pecado. Como diz São João Clímaco, 'Um pequeno cabelo irritará os olhos'. E Santo Isaque disse, "Não pense que a avareza consiste simplesmente na posse de prata ou ouro; ela está presente quando nosso pensamento é atraído para alguma coisa". O próprio Senhor disse, "Onde está o teu tesouro, ai estará o teu coração" (Mat. 6: 21) - de igual modo nos interesses e pensamentos mundanos. Por esta razão, todos devem ser desprendidos e devem devotar-se a Deus. Se eles vivem no mundo, podem ao menos obter algum entendimento do conhecimento espiritual. Ou eles podem devotar-se plenamente a Deus, interessando-se em fazer a Sua Vontade; e então Deus, vendo suas intenções, lhes garantirá repouso através do conhecimento espiritual. Por estes meios Ele lhes confere a meditação que pertence ao primeiro estágio de contemplação, que os capacita a adquirir contrição inexpressível de alma a tornar-se pobre em espírito (cf. Mateus 5:3). Conduzindo-os neste caminho gradualmente pelos outros estágios de contemplação, Ele lhes tornará possível manter as Beatitudes, até que obtenham paz em seus pensamentos. Esta paz é o 'reino' ou 'morada de Deus', como diz Evágrio, referindo-se ao Saltério: "Na paz é a Sua Morada" (cf. Salmo 76:2 Septuaginta).